Hoje, terça-feira, dia primeiro de fevereiro, são lembrados os 48 anos do incêndio do Edifício Joelma, em São Paulo. A tragédia, que resultou em 179 mortos e 300 feridos, aconteceu numa sexta-feira, dia primeiro de fevereiro de 1974. O incêndio teve início às 8h45, após um curto-circuito em um aparelho de ar-condicionado instalado no 12º andar. Após seis horas e meia, o fogo destruiu 14 dos 25 andares do prédio que abrigava os escritórios da Administração do Banco Crefisul de Investimentos e seis pavimentos de garagens. O fato aconteceu 23 dias antes do segundo aniversário de um outro grande incêndio em São Paulo, o do Edifício Andraus, em 1972, que resultou em 17 mortes e 376 feridos.
O Edifício Joelma foi inaugurado em 1971 e localizava-se no número 225 da Avenida Nove de Julho, com outras duas fachadas para a Praça da Bandeira (lateral) e para a Rua Santo Antônio (fundos). Após sua inauguração, foi locado pelo Banco Crefisul que transferiu para o local a maioria dos seus Departamentos. Revestido de pastilhas verdes, com janelas recuadas, ostentando largos parapeitos, possuía internamente muitas divisões de madeira, paredes revestidas de lambris e cortinas que facilitaram em muito o caminho do fogo.
Para atender a ocorrência praticamente todo o Corpo de Bombeiros de São Paulo (cerca de 450 homens) foi acionado, bem como várias outras entidades como: Polícia Civil, Polícia Militar, Guarda Civil, Exército, Força Aérea, Prefeitura de São Paulo e diversas empresas. A tragédia parou a cidade de São Paulo naquela sexta-feira. Alguns carros-pipa da Prefeitura de São Paulo chegaram a viajar mais de 30 quilômetros para transportar água até o local. Soldados do Exército ajudaram no policiamento. A Força Aérea Brasileira forneceu helicópteros que ajudaram no resgate das vítimas, bem como empresas poderosas, como o Bradesco, Audi e Pirelli, que também ofereceram seus helicópteros para as arriscadas manobras de descida dos bombeiros no prédio. O Hospital das Clínicas, local onde foram atendidas muitas vítimas, recebeu centenas de pessoas dispostas a doar sangue.
As cenas da tragédia foram mostradas pela televisão. Ainda hoje, na internet, é possível obter as imagens de dezenas de pessoas que se atiravam dos andares mais altos, tentando fugir do intenso calor das chamas e do sufoco provocado pela fumaça. Algumas tentavam alcançar e agarrar-se a uma das três escadas Magyrus dos bombeiros, que levaram a possibilidade de salvamento apenas a 45 metros de altura.
A tragédia do Edifício Joelma fez a cidade e as autoridades discutirem formas de prevenção e combate a incêndios, cujas deficiências foram evidentes tanto no Andraus como no Joelma. Na ocasião, o Código de Obras de São Paulo, que era de 1934, e que foi feito para uma cidade contando, na época, com 700 mil habitantes, foi alterado. O Corpo de Bombeiros, que, então, contava com recursos mínimos e equipamentos obsoletos, passou a receber mais atenção por parte das autoridades.
O Edifício Joelma foi reformado, recebendo o nome de Edifício Praça da Bandeira. Apesar de transcorridos 45 anos do incêndio, muitas das suas salas atuais estão vazias e dificilmente serão alugadas. Em 1978, um filme sobre o ocorrido, “Joelma 23º andar”, baseado no livro “Somos seis”, de autoria do médium Chico Xavier, que conta a história de uma garota morta no incêndio, foi apresentado nas salas de cinemas do Brasil. Especiais sobre o assunto foram exibidos recentemente em várias emissoras do País.
Uma testemunha de Amparo registrou as imagens da tragédia
O fotógrafo amparense Sérgio Vital Tafner Jorge, falecido wem 2020, fou uma das testemunhas do maior incêndio registrado em São Paulo. Na época, ele trabalhava como coordenador na área fotográfica da Editora Abril e acompanhou tudo de perto, captando todas as imagens possíveis. A foto feita por ele se tornou capa da Revista Veja. Em 2020, ele concedeu uma entrevista A Tribuna e falou sobre a tragêdia.
“Posso dizer que estive em uma guerra, saindo vivo, mas com lembranças que permanecem até hoje em meu subconsciente. Nada podia fazer por aqueles que perderam suas vidas. Apenas como fotógrafo, profissional, jornalista, pude documentar o fato também para que, após a publicação, fossem, no futuro, corrigidos erros de segurança contra fogo”, escreveu Sérgio Jorge em texto enviado ao Jornal A Tribuna.
A pedido da Redação deste jornal, ele escreveu um texto sobre como foi aquele primeiro de fevereiro de 1974. Veja abaixo o texto:
“Logo pela manhã, ouvindo o rádio, no momento do café, ouvi a notícia de tal incêndio em um prédio na cidade. Então, aos poucos, novas notícias eram passadas, relatando que, em minutos, o grande fogo se alastrava de andar por andar.
Como jornalista/fotógrafo, ao ouvir tais comentários e os relatos que ocorriam no local, resolvi pegar meu equipamento fotográfico e me dirigir para o Vale do Anhangabaú, onde ocorria o incêndio. Deveria já ser 9h40 da manhã, e a tragédia se desenrolava. Eu trabalhava como coordenador na área fotográfica da Editora Abril, portanto o acontecimento poderia ser uma matéria importante para a Revista Veja.
O fogo foi se alastrando rapidamente, passava de um andar para o outro em minutos; pessoas que estavam no prédio, visto aqui de fora, tentavam, pelas sacadas das janelas, fugir das chamas ou da grande fumaça escura que percorria toda a fachada do prédio. Foi tudo muito rápido: em poucos instantes, as chamas tomavam toda a parte frontal, e se via nos andares que pessoas ainda permaneciam no local. No 14º andar, um senhor, ainda de terno e gravata, ajudava outras pessoas no pequeno espaço da janela.
Aqui, nas ruas, uma grande multidão de pessoas, policiais, médicos, enfermeiros e centenas de bombeiros tentavam prestar socorro, socorro em parte, pois mesmo a alta escada Magirus não chegava além do 12º andar. O fogo, que se alastrava, já chegava aos andares superiores. A correria era imensa; muitos não aguentavam e se jogavam para uma morte rápida; outros tentavam subir para os andares superiores, mas também eram sufocados pela fumaça; outros chegavam ao teto.
Vi e acompanhei um casal que, com um pano molhado, ia passando nas pessoas e ajudava-as a descer de um andar para o outro, conseguindo, assim, salvá-las. Vi, também, que algumas pessoas, que estavam no 14º andar, tentavam saltar para a escada Magirus, que chegava somente até o 12º; nessa tentativa, erravam o salto, caindo para a morte. Porém, quem esperou, como o caso de uma senhora, foi salva pelos bombeiros com ajuda de uma segunda escada.
Por volta das 13 horas, com o fogo em menor proporção, helicópteros chegavam e tentavam salvar, mas a fumaça ainda subia e o calor no local dificultava o salvamento. Foram muitas tentativas até que, em uma delas, um bombeiro, pendurado por uma corda, passou a retirar pessoas ainda vivas que estavam no teto, sobre as telhas de amianto. Eram muitas viagens rápidas, de apenas 500 metros, até o teto da Câmara Municipal de São Paulo. Vendo isso, corri para lá e fotografei a chegada das pessoas, muito queimadas, tendo atendimento médico.
Assim passavam as horas, o fogo já havia terminado, a correria pelas ruas e pelo Vale do Anhangabaú ainda continuava; ambulâncias saíam transportando os mortos que haviam saltado do prédio. Eram muitos os que estavam próximos às laterais e só agora os bombeiros podiam apanhar os corpos. Tentei entrar e consegui permissão dos bombeiros. Cheguei até a porta do prédio com meu colega Mituo Shiguihara. O calor era forte, o vapor embaçava nossas lentes. Um bombeiro nos disse para não entrarmos, dizendo que tudo o que iríamos ver à nossa frente era muito trágico. Então, desistimos.
O material que fotografei foi publicado na capa da Revista Veja e nas páginas internas. Minhas fotos também serviram como base para o filme Inferno na Torre.
Posso dizer que estive em uma guerra, mas saindo vivo, porém com lembranças que permanecem até hoje em meu consciente. Nada podia fazer por aqueles que perderam suas vidas, Apenas como fotógrafo, profissional, jornalista, documentei o fato também para que, após a publicação, fossem, no futuro, corrigidos os erros para garantir segurança contra fogo. Ainda hoje, estamos sujeitos a incêndios, mas temos preocupação desde o início de uma construção prevendo acidentes futuros.
Chegando a hora final de meu trabalho, já estava ali vendo e documentando desde as 9h30 da manhã. Foram, portanto, sete horas clicando oito rolos de filmes 35mm, em cor.
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